Alma da casa

Sala com Arte na CasaCor RS
Pinturas e esculturas predominam (Foto André Bastian, divulgação)

Família é tudo. A frase clichê ganha sentido especial na Sala com Arte, do arquiteto Renato Mello, com a participação de Latifa Senna de Mello, esposa e parceira na construção do espaço na CasaCor Rio Grande do Sul, aberta no antigo Hospital da Criança Santo Antônio, até 8 de setembro. Esse ambiente, marcado por muita arte brasileira e por objetos de sua memória afetiva, tem origem na infância do arquiteto, em Pelotas. Um dos fatos determinantes para criar o gosto pela arte do arquiteto e o seu espírito de colecionador foi a convivência com a tia Luciana Reis, fundadora do Museu Leopoldo Gotuzzo, naquela cidade. A tendência de observar e valorizar objetos da casa da família na infância completa o combustível para criar uma Sala com alma e arte em 50 metros quadrados.

– O valor não está no objeto, mas sim no que ele te representa – interpreta Renato.

Bar ao fundo e parede com o maior volume de obras (Roberto Majola, divulgação)
Bar ao fundo e parede lateral com o maior volume de obras (Fotos Roberto Majola, divulgação)

O impacto de pelo menos 20 obras de arte assinadas por artistas que os visitantes da CasaCor costumam ver no acervo de museus – como Di Cavalcanti, Tarsila do Amaral, Anita Malfatti e Iberê Camargo – ocupam paredes e descansam sobre móveis na proposta de Renato Mello para a Sala com Arte. Esse ambiente tem o maior número de quadros da mostra gaúcha. E o profissional mostra ainda nos recantos do espaço como misturar antigo com novo e história de família com produção recente de móveis e objetos de design, como a luminária SLY, criação de Ronald Sasson, a poltrona Regina, assinada pela Natuzzi, e as mesas Ares e Delfos, de Paulo Sartori.

Design acompanhando a arte  (Roberto Majola, divulgação)
Design acompanhando a arte

Para sustentar quadros e esculturas, o arquiteto desenhou uma estante de material amadeirado com um nome sob medida para a proposta: Renoir, melamina com veios aplicada também em grandes painéis lisos e detalhes ripados. Renato especificou estante com iluminação para valorizar os elementos expostos e adicionou no espaço peças trazidas de sua casa, a maioria com origem na herança familiar pelotense. Entre os objetos, garrafas antigas de farmácia e também o especial tacho de fazer doces da avó. Essa peça passou a fazer parte de um conjunto abraçado por uma mesa transparente, para encaixar embaixo principalmente o tacho, valorizado por uma avenca, planta da época da avó que está na moda, agora parte da mesa de centro da sala.  

Quadros de artistas como Di Cavalcanti e Tarsila do Amaral (foto Roberto Majola, divulgação)
Quadros de artistas como Di Cavalcanti e Tarsila do Amaral encimam a mesa rústica de marcenaria

Já a mesa rústica de marcenaria trazida da casa de Renato e Latifa transformou-se em um aparador, disposto abaixo de vários quadros com molduras de época, como a obra “Marina envolta em folhas”, de Emiliano Di Cavalcanti, vinda de uma galeria de arte de Porto Alegre, com moldura rebuscada, em contraste com a madeira do móvel. E mais: a obra teria sido inspiração para a capa de um disco de Caetano Veloso, o psicodélico Tropicália. Conjunto coerente, embaixo da pintura, uma escultura em bronze de Alfredo Ceschiatti chamada Guanabara.

Renato prossegue, propondo como misturar, mas desta vez estilos de arte sem medo: em outra parede, pinturas geométricas como a de Arcângelo Ianelli convivem com um óleo figurativo, uma natureza morta de Leopoldo Gotuzzo que mostra um vaso com hibiscos coloridos. Aliás, todos os arranjos florais são feitos pelo arquiteto, como o de lindas alpínias vermelhas. Em todas as composições de quadros, dimensões, molduras e cores são misturadas com desenvoltura, mostrando que a combinação óbvia não é a única possibilidade ao criar uma decoração.

Obra de Burle Marx em lugar de TV (Roberto Majola, divulgação)
Obra de Burle Marx em lugar de TV

Não tem aparelho de TV na Sala com Arte, mas sim lareira no recanto principal, de estar, com um Burle Marx na parede acima dela. No sofá, a revelação de uma das preferências do arquiteto para “dar vida para a sala”: o uso de almofadas coloridas. Essas têm estampas aquareladas de Tricia Guild. No recanto de bar, mais um indício do décor afetivo: um licor de butiá para oferecer às visitas, em meio a garrafas e taças vindas da residência do casal Renato e Latifa. A ideia é propor um espaço agradável para contemplar a arte, recordar, conviver na área voltada ao hobby do dono da casa, personagem colecionador de arte que viveu em uma fazendo no Interior e vem para a Capital com a sua bagagem de afetos: arte, lembranças de viagens e cultura brasileira em uma mistura contemporânea.

Recanto de Estar (Roberto Majola, divulgação)
Recanto de Estar

Ambiente carregado de verdade, tem até os livros de Machado de Assis e Jorge Amado vindos de familiares do casal para serem usados na composição. Já as peças atuais foram garimpadas entre as disponíveis nas lojas parceiras, reforçando a proposta de sustentabilidade, pela utilização de mobiliário já produzido ou a reutilização de móveis e objetos em nova proposta, contando uma história carregada de afeto e significado.

Entre os materiais, remete à rusticidade o piso em concreto usinado e o revestimento da parede do hall, de ladrilho hidráulico artesanal feito para o ambiente, referência aos gradis antigos, como nas fazendas do interior. Em contraste, nichos e prateleiras em laca acetinada com o nome de Urca têm cores escolhidas pela estilista Isabela Capeto, inspiradas na brasilidade. Um cabideiro de madeira torneada desembarcou no Brasil há gerações, trazido pela tataravó de Renato, Alice, hoje nome da filha de três anos do casal. Desde esse ponto, a viagem pela arte e pelos objetos com história tem fundo musical de MPB, claro.

Herança de família no hall de entrada (Roberto Majola, divulgação)
Herança de família no hall de entrada

Renato Mello Arquitetura – (51) 981749080

Instagram @renatomelloarquitetura

Escrito por
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